Há dons espirituais que, quando se manifestam, não brilham como dádivas, mas ardem como feridas. Aquele que os carrega se vê no limiar entre duas ordens de realidade: a visível, compartilhada, onde todos se reconhecem, e a invisível, íntima, onde poucos ousam permanecer.
O que para alguns é revelação, para outros soa como delírio. A visão espiritual — seja ela intuição aguçada, memória de outras vidas ou percepção do invisível — frequentemente é interpretada pela sociedade como desequilíbrio. Assim, o dom que amplia a consciência pode isolar o indivíduo, condenando-o à suspeita de loucura.
Esse paradoxo revela o quanto a linha entre consciência e loucura não está na experiência em si, mas no olhar coletivo. Aquilo que escapa às fronteiras da razão comum é muitas vezes silenciado como patologia.
O portador do dom, então, é lançado ao exílio: vive a tensão de saber o que os outros não sabem e, ao mesmo tempo, ser desacreditado por justamente ver mais além.Talvez seja essa a verdadeira maldição: não o dom em si, mas a solidão de carregá-lo em um mundo que não possui linguagem para acolhê-lo.
A diferença entre visionário e louco não está na experiência, mas na época — e no grau de escuta que a sociedade oferece.Assim, o dom espiritual se converte em martírio: um excesso de realidade que os outros não reconhecem. Mas, por trás daquilo que chamam loucura, talvez se esconda a forma mais radical de lucidez — uma que ainda não encontrou tradução coletiva.
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